No Congo, rebeldes consolidam controle sobre Goma e tomam aeroporto da cidade
Os rebeldes do M23, apoiados por Ruanda, entraram na cidade, a maior do leste do país, na segunda-feira (27). A escalada do conflito, que já dura mais de uma década, preocupa autoridades; os EUA afirmaram pediram medidas ao Conselho de Segurança da ONU. Rebeldes do M23 patrulham posto de fronteira
AP Photo/Brian Inganga
No Congo, os rebeldes do M23, apoiados por Ruanda, consolidaram seu controle sobre Goma, maior cidade do leste do país, invadida na segunda-feira (27), segundo a Organização das Nações Unidas.
Nesta terça-feira (28), o grupo tomou o aeroporto internacional da cidade, o que pode cortar a principal rota de ajuda e, segundo a agência de notícias Associated Press, embora as forças do governo ainda estejam em algumas áreas de Goma, a maior parte dela está nas mãos dos rebeldes.
O M23, composto principalmente por tutsis étnicos, disse à AP que planeja criar uma administração na cidade para que as pessoas possam continuar vivendo vidas normais e os deslocados possam retornar para casa.
Bertrand Bisimwa, que lidera a ala política do M23, disse na rede social X que os últimos focos de resistência em Goma foram reprimidos e que os rebeldes estavam trabalhando para garantir "segurança total".
Nesta quarta-feira (29), segundo a agência de notícias Reuters, colunas de mercenários romenos contratados para lutar pelo Congo entraram em Ruanda sob rigorosa supervisão das forças de segurança ruandesas.
Na segunda, um vídeo divulgado nas redes sociais mostra homens em trajes civis entrando na base das forças de paz da ONU em Goma e entregando armas para os militares uruguaios que atuam como Capacetes Azuis (veja no vídeo abaixo).
As tropas informaram que o grupo é formado por soldados congoleses que buscaram proteção durante a invasão dos rebeldes na segunda-feira e que, desde então, estão abrigados nas instalações.
Homens entregam armas para agentes da ONU em Goma, no Congo, durante invasão de rebeldes
Um morador de Goma que vive em uma parte nobre da cidade diz que a situação no local é surreal:
"Parece que estamos em uma nação dupla. Estamos no Congo e ao mesmo tempo em Ruanda", disse o morador à Reuters, recusando-se a ser identificado por medo de represálias.
Desde domingo (26), quando os rebeldes começaram a se aproximar de Goma, milhares de moradores fugiram. Muitos atravessaram a pé a fronteira com Ruanda em Gisenyi.
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Secretário-geral da ONU pede que Congo e Ruanda protejam civis na fronteira dos dois países
Autoridades de segurança de Ruanda verificam pessoas cruzando do Congo em Gyseny
AP Photo/Yuhi Irakiza
A escalada do conflito, que já dura mais de uma década, preocupa autoridades mundiais. Nesta terça, os Estados Unidos pediram ao Conselho de Segurança da ONU que tomasse medidas para deter a ofensiva, e a União Africana exigiu a retirada imediata do M23 das áreas ocupadas.
Em uma publicação no X, o presidente de Ruanda, Paul Kagame, que nega apoiar o M23, disse que concordou com a necessidade de um cessar-fogo em um telefonema com o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, mas não deu nenhuma indicação de que iria ceder às exigências de retirada de Goma.
Segundo comunicado do Departamento de Estado dos EUA, Rubio disse a Kagame que o governo americano está "profundamente preocupado" com a escalada da violência, que é a pior em mais de uma década, e pediu respeito à "integridade territorial soberana".
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Em sua audiência geral semanal, nesta quarta-feira (29), o Papa Francisco pediu o fim das hostilidades e a proteção dos civis:
“Esperamos que todas as formas de violência contra as pessoas e suas propriedades cessem o mais rápido possível (e) convido as autoridades locais e a comunidade internacional a fazerem todos os esforços para resolver o conflito por meios pacíficos".
De acordo com o governo do Congo, nesta quarta, o presidente congolês, Felix Tshisekedi, fará seu primeiro pronunciamento público desde a invasão dos rebeldes a Goma.
Também nesta quarta, a Comunidade da África Oriental, formada por oito países membros - entre eles Congo e Ruanda - deve realizar uma cúpula de emergência sobre a crise. Uma fonte do governo ruandês afirma que seu presidente irá comparecer; já Tshisekedi não deve participar.
O M23 é a mais recente de uma série de insurgências lideradas por tutsis e apoiadas por Ruanda que têm abalado o Congo desde o genocídio ocorrido no país vizinho há 30 anos, quando extremistas hutus mataram tutsis e hutus moderados e depois foram derrubados pelas forças lideradas por tutsis e por Kagame.
Ruanda diz que alguns dos perpetradores expulsos estão abrigados no Congo desde o genocídio, representando uma ameaça aos tutsis do Congo e à própria Ruanda. O Congo rejeita as queixas de Ruanda e diz que Ruanda usou suas milícias proxy para saquear minerais lucrativos.
Crianças e jovens deixando Goma antes da invasão de rebeldes
AP Photo/Moses Sawasawa
O avanço em Goma é o ápice de uma batalha prolongada entre os rebeldes e o governo, que fez com que várias cidades ao longo da fronteira com Ruanda caíssem nas mãos dos insurgentes.
Autoridades do Congo afirmam que o país está "em uma situação de guerra" e acusam Ruanda de cometer "uma agressão frontal (e) uma declaração de guerra". O país cortou relações com o vizinho no fim de semana após tentativas recentes de negociações diplomáticas entre eles falharem.
Nos últimos dias, os combates se intensificavam, apesar dos apelos do Conselho de Segurança da ONU para que os rebeldes se retirassem.
“Os membros do Conselho de Segurança condenaram o flagrante desrespeito à soberania e à integridade territorial da RDC... e que o M23 pôs fim ao estabelecimento de administrações paralelas no território da RDC”, acrescentou a declaração, referindo-se ao nome formal do Congo, República Democrática do Congo.
Analistas alertam que a mais recente escalada de hostilidades pode desestabilizar ainda mais a região, que já abriga uma das maiores crises humanitárias do mundo, com mais de 6 milhões de pessoas deslocadas.
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